O risco de não ser sustentável

January 23, 2013 | Categoria: Engineering

Por Karla Spotorno e Luciana Bruno | De São Paulo e do Rio

Pimentel, da Dinamus: questões podem trazer multas e restrições à capacidade operacional das empresas

No mercado de ações, as reações são rápidas. Neste início de ano, a inclusão de uma das filiais da construtora MRV Engenharia na lista "suja" do Ministério do Trabalho - por conta de denúncia envolvendo trabalho análogo à escravidão - foi sucedida por uma queda acentuada das ações da companhia. No pior fechamento antes da divulgação das prévias operacionais da empresa, em 18 de janeiro, o papel registrou uma desvalorização de 6,92% (período entre 28 de dezembro, quando a lista foi divulgada, e 11 de janeiro). Considerando o pregão do dia 18 de janeiro, que pode ter sido influenciado pelos dados operacionais preliminares, que vieram abaixo da expectativa do mercado, a perda dos papéis da MRV em bolsa chegou a 7,18%.

O episódio suscitou algumas perguntas sobre um tema muito presente no mundo empresarial, mas, aparentemente, pouco maduro no universo financeiro: a sustentabilidade. Será que o investidor penalizou a ação da empresa pelo fato de ter sido incluída na lista? Problemas trabalhistas, sociais e ambientais podem derrubar o valor de mercado de uma companhia? Se isso ocorreu, empresas que investem em sustentabilidade e agem de acordo com as normas de responsabilidade socioambiental tendem a ficar menos suscetíveis a movimentos bruscos deste tipo?

O caso da MRV, parceira do programa "Minha Casa, Minha Vida 2", do governo federal, pode ajudar refletir sobre algumas dessas questões, inclusive sobre o comportamento do investidor. Para Roberto Altenhofen, analista da Empiricus Research, o mercado reage mais às consequências do episódio - leia-se a interrupção dos financiamentos da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil para contratações novas - do que ao fato em si. "É claro que o evento [do trabalho análogo à escravidão] é grave, mas, sob a ótica do investidor, a questão financeira é mais importante em um primeiro momento", diz Altenhofen. Consultada, a MRV disse que continua "atuando nas esferas cabíveis" para excluir seu nome da lista (ver mais na matéria abaixo).

Para Gustavo Pimentel, sócio da Dinamus Consultoria e especialista em sustentabilidade, quando uma empresa enfrenta alguma crise, o analista e o investidor refazem as projeções de receita e, consequentemente, do preço do papel. Se existe a iminência de algum problema afetar a geração de caixa da companhia, é preciso embutir esse risco na cotação. Segundo Pimentel, o objetivo da análise sob o viés da sustentabilidade é avaliar de forma mais precisa este risco. O consultor pondera que este trabalho segue a mesma linha do processo tradicional da análise fundamentalista. A diferença é que são adicionados critérios sociais e ambientais à avaliação econômico-financeira da companhia.

"A análise acaba ficando muito mais completa", afirma Denise Hills, superintendente de sustentabilidade do Itaú Unibanco. Para a especialista, a iniciativa é interessante e coloca em vantagem quem conseguir incrementar primeiro a sua capacidade de avaliação.

O economista Hugo Penteado, da gestora de recursos do Santander, concorda. "Quando o investidor aborda como a empresa atua nessa direção, está avaliando não apenas se a companhia leva o meio ambiente em consideração nas decisões dos seus negócios, mas acima de tudo se ela possui uma boa gestão de riscos", diz Penteado. "O viés da sustentabilidade é considerado uma excelente análise de riscos, pois aprofunda e toca em temas que não são percebidos pelas avaliações tradicionais, antecipando temas e prevenindo a empresa de eventos indesejáveis."

Na dimensão social, Pimentel, da Dinamus, afirma que é levada em conta a relação da empresa com trabalhadores próprios e terceirizados, fornecedores, clientes e com a comunidade. Pelo lado ambiental, são observadas a eficiência energética, de uso de insumos e matérias-primas, a gestão dos resíduos sólidos, efluentes e a emissão de gases, além da qualidade e quantidade dos recursos hídricos. "São questões que podem trazer multas e restrições à capacidade de a empresa continuar operando", afirma Pimentel.

Observando esses critérios, a equipe da Dinamus projetou o impacto de eventos negativos em empresas com menor e maior risco de enfrentar problemas socioambientais. Pelo levantamento, as companhias mais sustentáveis sofreriam uma depreciação menor na cotação de suas ações caso viessem a enfrentar uma crise. "O estudo demonstrou a magnitude do impacto de um problema socioambiental dadas a exposição e a forma como as empresas gerem questões dessa natureza", diz Pimentel. A diferença no setor da construção civil é grande. As empresas menos sustentáveis poderiam perder 51% do valor de mercado em meio a um problema desta natureza. As mais sustentáveis perderiam 5,4%.

Na opinião de Gilberto Nagai, superintendente de renda variável da Itaú Asset, ao incluir as questões socioambientais em sua tomada de decisão, o investidor não está tentando ser generoso e solidário. Está, na verdade, preocupado em enxergar os riscos reais apresentados pelas empresas. "É comprovado que, quanto mais transparente, mais preocupada com o cliente e com o meio ambiente é a empresa, mais sustentável no longo prazo é o seu modelo de negócios", afirma.