Energia para o futuro: o que é hidrogênio, quais os tipos e sua importância

May 02, 2022 | Categoria: Energy

Por Jennifer Ann Thomas, para Um Só Planeta

A emergência climática é o maior desafio desta geração. Em comparação com níveis pré-industriais, a temperatura do planeta aumentou 1,1ºC e, caso as emissões de gases de efeito estufa continuem no ritmo atual, projeções demonstram que o aquecimento do planeta pode ultrapassar 2ºC ou até mesmo 3ºC. A principal maneira para evitar que a Terra continue esquentando é descarbonizar a economia. Ou seja, aposentar os combustíveis fósseis e investir em fontes limpas e renováveis. Entre as soluções mais promissoras, o hidrogênio – um gás sem cheiro, sem cor e sem sabor – se tornou o foco para o investimento em pesquisa e inovação.

 

De acordo com o diretor-presidente do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), André Ferreira, o hidrogênio tem um grande poder calorífico, o que faz com que ele seja um combustível, e ele é uma fonte de energia importante. “Apesar dessas características e de ser muito abundante, ele não é encontrado na natureza de uma forma natural e disponível para ser usado como combustível. O hidrogênio precisa ser produzido”, afirmou. Essa produção significa separá-lo de outros elementos. A água, por exemplo, é representada pela fórmula H2O: uma molécula com dois átomos de hidrogênio e um átomo de oxigênio. Então, é preciso quebrar essa molécula para que o hidrogênio seja aproveitado como combustível.

Ou seja, o hidrogênio tem alto potencial como combustível, ao mesmo tempo em que é preciso usar energia para separá-lo de outros elementos. É esse processo que pode determinar se o elemento químico será uma alternativa sustentável ou não para a transição energética necessária dentro do cenário de descarbonização da economia. Uma das formas mais comuns para a obtenção de hidrogênio é a partir do gás natural.

O processo de produção consiste em decompor o gás natural em H2 e CO2, o dióxido de carbono, grande vilão do aquecimento global. De acordo com a empresa de consultoria empresarial norte-americana McKinsey & Company, o processo a partir do gás natural é altamente poluente pois resulta em 10 quilos de CO2 para cada 1 quilo de H2. “Em menor quantidade, o hidrogênio também é produzido a partir do carvão. Junto ao gás natural, essas formas de produção emitem muito CO2. Para a transição energética, não é uma alternativa”, disse Ferreira. O hidrogênio produzido a partir do gás natural ficou conhecido como o hidrogênio cinza.

Porém, assim como há avanços para fortalecer as fontes de energia renováveis como opções primárias na economia, como a solar e a eólica, o mesmo processo está acontecendo para a produção de hidrogênio. Se a energia empregada para obter o hidrogênio for limpa, ele se torna um combustível sustentável. “Com o barateamento da energia eólica e solar, e com a questão da mudança climática, começou-se a pesquisar outras formas de produzir hidrogênio. Foi a partir dessa busca que se convencionou identificar o hidrogênio por cores para sinalizar a forma como ele foi produzido”, explicou Ferreira.

Na escala de cores, há o hidrogênio azul, que também é obtido a partir do gás natural, mas outras tecnologias são aplicadas para que ele seja mais sustentável. De acordo com a McKinsey & Company, quando existe captura e armazenamento do gás carbônico resultante, o hidrogênio é chamado de azul. Ele é menos poluente, pois produz entre 1 e 3 quilos de CO2 para cada 1 quilo de H2 – a tecnologia atual ainda não permite armazenar todo o dióxido de carbono produzido.

Enquanto o azul já representa um avanço significativo com relação ao cinza, a emergência climática exige que a tecnologia continue avançando para emitir o mínimo possível de gases de efeito estufa. Em novembro de 2021, lideranças globais se reuniram em Glasgow, na Escócia, durante a COP26 para finalizar o chamado livro de regras do Acordo de Paris e colocar em prática as ações necessárias para atingir as metas definidas no tratado internacional. A conferência deveria ter sido realizada em 2020 – no entanto, por causa da pandemia de coronavírus, o encontro foi adiado. Em meio ao processo de recuperação econômica dos países após a crise sanitária, o aquecimento global não deu trégua e é preciso agir para frear o aquecimento do planeta.

Por isso, a grande aposta para as próximas décadas é no hidrogênio verde. “O hidrogênio verde é o tema no mundo hoje. Ele é produzido utilizando energia eólica, solar e água a partir do processo de eletrólise, que usa bastante energia elétrica. Considerando que a energia seria sempre eólica ou solar, em tese, esse hidrogênio seria livre de CO2”, disse Ferreira. Na avaliação da McKinsey & Company, quando a matriz elétrica é sustentável, as emissões de CO2 são nulas.

A sustentabilidade no processo de obtenção do hidrogênio verde é uma questão-chave para que ele seja, de fato, uma ferramenta positiva. “A depender da origem da água, a produção não é sustentável. Por isso, há muitas plantas que são planejadas na beira do mar. Nesse caso, será preciso dessalinizar a água. Caso enormes volumes de água doce sejam retirados de fontes do continente, os efeitos podem ser negativos”, explicou Ferreira.

Se hoje é possível vislumbrar um futuro em que um combustível limpo seja extraído a partir de fontes de energia renováveis, foram muitos anos de pesquisa e desenvolvimento para construir esse caminho. Mesmo agora, em pleno 2022, o hidrogênio verde é uma tecnologia que precisa ser aprimorada ao longo das próximas décadas. “Essa opção ganhou força por causa do barateamento dos custos da geração solar e eólica nos últimos anos. Uma das razões para o hidrogênio não ter sido opção até hoje é o preço dele, que continua caro”, afirmou Ferreira.

O hidrogênio é uma fonte de energia muito versátil. “Pode ser usado no próprio setor elétrico porque ele funciona como uma bateria. Há ocasiões em que o vento e o Sol não são tão proveitosos para a geração de energia, pois não há uso de eletricidade naquele momento. No caso do hidrogênio, é possível gerar a energia a qualquer hora e armazená-la como uma bateria”, acrescenta. Dessa forma, o hidrogênio funciona como uma espécie de bateria do sistema elétrico. Ele compatibiliza a produção e a demanda de eletricidade.

Outro desafio que pode ser resolvido com o hidrogênio é o sistema de transportes de longa distância, especialmente no caso de caminhões que dependem de diesel. Montadoras desse tipo de veículo, como a Daimler e a Hyundai, já anunciaram metas para começar a substituição do combustível ao longo da próxima década. Em maio de 2021, a Daimler anunciou que pretende converter 100% de sua linha de veículos para a tecnologia de emissão zero em até 15 anos.

Por sua vez, a Hyundai divulgou que terá 1.600 caminhões movidos a hidrogênio na Suíça até 2025. O prazo para as metas está alinhado à realidade do tempo necessário para que o combustível se torne uma opção viável. “O hidrogênio não é para já, ele não vai fazer uma mudança significativa nos próximos dez ou quinze anos. Ainda estamos em um estágio bastante inicial”, disse Ferreira.

Gerar demanda pelo produto é uma das formas para acelerar o processo e, em agosto de 2021, o governo federal apresentou a proposição de diretrizes para o Programa Nacional do Hidrogênio (PNH2) aos membros do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). De acordo com uma nota oficial do governo, “o PNH2 se propõe a definir um conjunto de ações que facilite o desenvolvimento conjunto de três pilares fundamentais para o sucesso do desenvolvimento de uma economia do hidrogênio: políticas públicas, tecnologia e mercado”.

Além da produção para consumo interno, o Brasil tem o potencial de se tornar um dos grandes exportadores de hidrogênio para o mundo. Com a diversidade de fontes renováveis, como hidráulica, eólica e solar, e a possibilidade de converter o hidrogênio em bateria, investidores já enxergam as vantagens da produção do combustível no Brasil. Os portos de Pecém, no Ceará, de Suape, em Pernambuco, e do Açu, no Rio de Janeiro, atraem o interesse de recurso estrangeiro.

Segundo a McKinsey, para viabilizar a indústria do hidrogênio verde no país, serão necessários 200 bilhões de dólares em investimento, “incluindo 180 GW de capacidade adicional vinda de fontes de energia renováveis, o que é mais do que a capacidade total de geração em 2020”.