Como será o primeiro leilão de hidrogênio verde do mundo

January 23, 2023 | Categoria: Energy

Editada por Nayara Machado

Colaborou Gabriel Chiappini

A Alemanha lançou no final do ano passado o primeiro leilão da política H2Global para contratos de longo prazo de fornecimento de hidrogênio verde (H2V) na forma de derivados: amônia, metanol e combustível sustentável de aviação (SAF, em inglês).

A primeira licitação será para contratos de amônia verde e o prazo para submissão é 7 de fevereiro. Já as submissões para os certames de SAF e metanol vão até 21 de fevereiro.

O leilão é um marco para a economia do hidrogênio verde. Inaugura a política de incentivos alemã para aquisição do energético de fora da Europa – já que os contratos são exclusivos para importação dos derivados de H2V.

É apontado também como uma oportunidade para o Brasil. Embora o país ainda não esteja pronto para participar desta primeira seleção, as empresas aqui estão atentas ao movimento alemão para viabilizar seus projetos nos portos brasileiros.

Como vai funcionar? A Alemanha criou uma empresa, a HINT.CO GmbH (Hintco), para atuar como intermediária e subsidiar a diferença entre os contratos de longo prazo (importação) e os de curto prazo com os compradores europeus (as indústrias que vão adquirir o H2V).

A Hintco conta com um fundo de 900 milhões de euros fornecidos pelo governo para isso.

A ideia é que esse instrumento de financiamento permita a compra de produtos pelo preço mais baixo possível por meio da licitação. Do lado da demanda, os contratos de venda a curto prazo serão celebrados com a oferta mais elevada. A diferença esperada entre os preços é compensada com financiamento público.

Para concorrer, as empresas ou consórcios precisam se enquadrar em critérios como experiência na produção de hidrogênio (pode ser fóssil), no fornecimento ou geração de eletricidade renovável, construção e/ou operação de plantas de H2 ou derivados, transporte de substâncias perigosas, entre outros.

Também precisam demonstrar estudos de uso da água – já que a única rota aceita na concorrência é a eletrólise – e impactos sociais.

A energia deverá ser exclusivamente renovável e a produção de amônia precisará reduzir no mínimo 73% as emissões de CO2 equivalente.

São aceitos três tipos de suprimento de eletricidade: geração própria off grid, PPA (power purchase agreement) e descontratado (spot).

Os contratos terão duração de dez anos, com critérios fixos e a primeira entrega em 2024. No caso da amônia, até 2033, são previstas até 20 entregas de lotes de carga por ano, em portos da Alemanha, Bélgica e Países Baixos.

Os preços serão definidos pela soma preço do produto + transporte + logística + impostos ou taxas.

O edital define como preço teto para amônia 1.282 euros/tonelada, considerando 952 euros/tonelada o valor médio + 35% de mark up (diferença entre o custo do produto e seu preço de venda).

“O fato de o Brasil se situar mais distante da União Europeia que alguns potenciais competidores implica em desvantagem competitiva, relativa ao maior custo com navegação”, analisa Thereza Aquino, professora da UFRJ e especialista do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel).

Nesta segunda (16/1), o Gesel e a Câmara de Comércio Brasil-Alemanha (AHK Rio) apresentaram algumas simulações sobre a licitação.

Pelos cálculos do grupo, com os valores fixados no edital, a licitação deve render cerca de 125 mil toneladas/ano de amônia verde, demandando mais de 25,1 mil toneladas de H2V/ano e 167 MW de eletrólise.

‘Brasil precisa surfar essa onda’

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), foi a Davos, na Suíça, esta semana buscar parceiros na área de energia, durante o Fórum Econômico Mundial (WEF, em inglês).

Em entrevista à CNN, Leite disse que o Brasil precisa surfar essa onda. “É uma oportunidade de negócios que, infelizmente, não foi bem aproveitada porque o país ficou com a sua imagem manchada nos últimos anos”.

Segundo o governador, o RS, que tem sua força no agronegócio, também tem potencial de geração de energia renovável para exportar e para ser consumida internamente.

“Estamos mostrando o trabalho do RS para sermos um estado capaz de sediar uma planta de geração de hidrogênio verde”.

Além de ter mais de 80% da sua matriz energética renovável, com potencial de geração eólica e solar para o H2V, o RS também tem uma demanda por fertilizantes capaz de colaborar para a viabilidade de projetos desse tipo.

Vale dizer: o Brasil ainda não tem uma política para o hidrogênio verde, ou de baixo carbono. Por hora, temos um “plano de fazer planos”, enquanto memorandos de entendimento para estudar viabilidade de projetos se multiplicam em portos.

E governos estaduais correm por fora para desenhar suas próprias estratégias e atrair investidores internacionais, além de desenvolver um mercado interno.

Agora em janeiro, Goiás sancionou uma política estadual para incentivar o uso do H2V no transporte público e na agricultura, com a produção de fertilizantes – o foco é no consumo local.

O Paraná também estuda uma regulação local. Na semana passada, o governo estadual reuniu Copel, Sanepar, Parque Tecnológico de Itaipu e Invest Paraná para discutir como estruturar o estado para apresentar, futuramente, vantagem competitiva sobre outros territórios com produção de energia sustentável e barata.

Segundo o secretário de Planejamento, Guto Silva, o Paraná pode se tornar um polo na produção energética nessa matriz e o plano de hidrogênio estará no plano estratégico de projetos estruturais de médio e longo prazo do estado.